domingo, 29 de agosto de 2010

De volta à estrada

Quando outro amor deixa o coração seco.

Quando a mente pulsa pela madrugada quente e seca da estiagem.

Quando a poeira do velho ônibus da ilusão parte e o que resta são os grilos da razão na noite solitária e sem lua.



É que se percebe a velha estrada de volta, debaixo de seus pés.



O mundo dos apaixonados tem dessas coisas... Nos arranca do chão sem que possamos perceber, nos arremessa para todos os extremos de uma das mais esperadas de todas as emoções humanas. Chega até a nos iludir com promessas de realidade e longevidade.



Mas a fugacidade desses sentimentos intensos muitas vezes nos faz esquecer dela: a boa e velha estrada.



Quando menina, volta e meia eu era abordada por alguém que me enchia de perguntas, num daqueles testezinhos de psicologia de almanaque, do tipo "A guerra nuclear começou e você vai morrer, quais são seus 3 últimos desejos?". A partir das minhas respostas, o aplicador do teste tinha um perfil psicológico pronto.



Dessas bobagens todas o teste do qual me recordo com mais clareza é um tal de teste da estrada.
Veja só porque:


"Você está em uma estrada. Como ela é?"

E eu respondia:

"Asfaltada."

Respondi assim na ocasião por causa dos road movies que eu adorava e ainda adoro!

"Caminhando por essa estrada, você encontra um vaso. Você leva ou deixa?"

"Deixo!"

O que é que um vaso tem a ver com o cenário?

"Continuando a caminhar pela estrada, você encontra uma chave. Você leva ou deixa?"

"Levo!"

De repente achei melhor pegar, vai que é algum tipo de pegadinha cruel dessas brincadeirinhas de psicologia de almanque do tipo "vc não pegou, isso significa que vai ficar careca por causa da radiação nuclear" a neura daquela ocasião! Vai saber?

"Continuando pela estrada você encontra uma concha fechada. Você leva ou deixa?"

"Eu deixo!"

Por que eu levaria isso? Credo! E se o bicho que mora lá dentro me morder? Eu era muito urbanóide na ocasião.

"Continuando pela estrada você encontra um muro. Ao pular o muro o que vc encontra?"

"A estrada de novo!"

Ué!

Lembro até hoje da fisionomia da minha amiga que aplicou o teste!
Parecia o anúncio da própria guerra nuclear!


Resumindo:

A estrada de asfalto significava que eu era uma pessoa que gostava de coisas artificiais.

Tentei explicar que era por causa dos road movies, mas ela foi sumária:

"A resposta tem que ser sem pensar!"

O vaso significava a família, ou seja, eu não me importava com a minha família.

Tentei explicar sobre a falta de sentido em levar um vaso naquelas circunstâncias, mas a resposta foi a mesma.

Mesmo com o meu pânico latente, ela continuou com sua interpretação.

A chave significava as amizades, portanto eu me importava com as minhas amizades.

Senti um pequeno alívio naquele momento, exceto pelo terror que a próxima leitura de imagem me traria.

Não levar a concha fechada, significava não encontrar o verdadeiro amor.

Meu coração parou!

Mas ainda não havia terminado.

O muro significava o momento decisivo da vida.
Portanto no meu caso, com a estrada continuando a mesma após o salto, tudo continuaria como sempre foi, uma repetição constante da vida artificial, sem me importar com a minha família, apenas me importando com os meus amigos e sem encontrar o amor verdadeiro.


Essa brincadeira me gela o sangue até hoje!
Pura filosofia de almanaque, verdade, mas mesmo assim, trata-se de um vislumbre apavorante.

Não sei dizer exatamente se alguma coisa coincidiu ou ainda coincide totalmente ou em parte com a leitura de imagem feita pela minha amiga.


Continuo gostando de road movies e continuo sonhando com o meu maverick v8, cruzando o país, mas meu país está longe de ter estradas asfaltadas que cruzem seu território, logo isso está mais para fantasia do que para um ideal. Para caminhada, uma boa trilha em uma mata bem fechada é a minha preferência absoluta.


Amo minha família, com uma devoção que não tive na tenra adolescência, quando esse teste foi aplicado.


Amigos? Raros, cada ano menos e não são companheiros de caminho, por isso não me importo tanto com eles. Percebo cada dia mais que estão mais preocupados em cuidar dos seus próprios caminhos e eu não os julgo. Também deveria cuidar do meu... Mas isso fica pra outro post, ok?


Amor verdadeiro... Bem essa é a única verdade desse teste que aparentemente ainda prevalece. Encontrei com várias faces do amor, mas nenhuma delas foi verdadeira o bastante para resistir à dor pela passagem do tempo e à necessidade de liberdade que tanto eu quanto meus amantes sentimos. Esses sim me pareceram sentimentos muito verdadeiros nas muitas repetições que rolaram.


Não sei se há um único muro. Já pulei alguns, neste caso a história só se repetiu com o verdadeiro amor, a família só me fortaleceu e os amigos, na maioria, só se mostraram interesseiros, egoístas e vaidosos, salvo os poucos que restam, mudando profundamente o tipo de apego que tinha por eles.


Acredito que a estrada é a única figura de imagem que realmente é concreta. Vejo a família como um laço espiritual poderoso e acima do real, o amor verdadeiro, por enquanto vejo como uma grande alucinação e os amigos como uma lição de caráter constante que me deixa sempre alerta com a próxima tarefa.


A estrada sim é bastante real!


E eu sinto o quanto ela é real em momentos como este, pois é como se ela estivesse bem debaixo de meus pés como já escrevi inicialmente. Mutante, ela se transforma conforme o caminho vai cruzando novos lotes de aprendizado. Nesta noite quente e seca, ela é de terra batida, com inúmeras pedras pontiagudas e brilhantes. Refletindo o brilho das estrelas, ela corta um imenso campo verde amarelado, seco pela estiagem e leva para as colinas onde há mais campos semelhantes, com as luzes do próximo lote no horizonte próximo.


Na minha leitura de imagem, me vejo caminhamdo por ela descalça, mas meus pés não pisam nas pedras, porque estou feliz por estar de volta a ela, logo tudo está harmonizado. Meu coração celebra mais uma dor de amor não verdadeiro que se foi, mas o amor da minha família me consola e a alegria de ter poucos amigos que aparentemente sabem me deixar em paz e que estão em paz me recompõe e me acalma.


Um vento quente balança meus cabelos e minhas mãos giram meu vestido branco decorado com bordados de flores brancas vasadas, que combinam com as minhas jóias brilhantes na forma de corações e estrelas combinados com pérolas, que por sua vez combinam com meu sorriso e o brilho nos meus olhos pela esperança que se renova ao caminhar com os pés no chão e os olhos voltados para as estrelas.


Uma boa noite quente para todos!

E lembrem-se, não vale fazer o teste agora que já sabem o signficado das imagens. Mesmo porque, eu sou a prova viva de que este tipo de teste só funciona de uns 25% a 30% aproximadamente e que eu saiba até agora, claro!

Se alguma coisa mudar eu aviso!

Agora vou continuar na minha estrada, porque a noite está linda!

Boa noite e dirijam com cuidado em suas estradas!