domingo, 12 de outubro de 2008

O homem que falava em listas

Tem umas figuras maníacas que simplesmente se materializam na sua frente não?



Quando fiz as pazes com o verão e voltei a usar cores alegres nas roupas, mechas douradas e flores naturais nos cabelos, mal sabia que na verdade estava dando a abertura para dar de cara com uma delas.



A quase dois anos atrás, caminhando pelas ruas de uma cidade litorânea fantástica qualquer entre as tantas maravilhas do meu país, apreciando as luzes e as cores da estação mais esperada do ano. Me deparo com o olhar que distingüe o másculo do masculino. Ahh sim! Há homens que sabem apreciar o que é uma mulher... São raros! E é uma festa encontrá-los!



A maioria fica procurando padrões, bastante comum aliás. Os olhos deles passam atravessando as pessoas em busca da convenção escolhida pela maioria. Mas há aqueles que apreciam aquele detalhe que você escolheu para complementar a barra da saia, a barriguinha escondida e o decote disfarçado.



Esses, apenas com o senho frazido que demonstram quando apuram o olhar e com o sorriso mínimo, quase imperceptível que abrem ao vê-la passar, fazem-na andar mais devagar, requebrar um pouquinho mais e andar na ponta dos pés assim que se deparar com um obstáculo qualquer, propositadamente claro! Só para estender o momento.



Foi o ocorrido, entre eu e um motoqueiro, que passava pela rua em que eu passeava, em sentido oposto e em rota de colisão.



Tantos foram os outros encontros casuais, até as apresentações, as lacunas entre as frases, os olhares cada vez mais longos, o charme e a sedução crescentes, a cada reencontro a expectativa galopante...



Mas qual não foi a surpresa quando da primeira vez em que todo o desejo se consumiu, que o tal, o olhar tão másculo, o indivíduo que aparentava tanta capacidade em destacar qualidades que poucos outros haviam percebido, não começou a despejar listas de preferências e ocorrências?



Estática, contemplei mais um exemplar masculino torpe - por favor não se ofendam os que não tem necessidade de se reafirmar como machos a cada três minutos - falando em listas de mulheres que já havia colecionado, classificado e, para meu delírio, que abrira uma categoria para mim!



Lisonjeada e ao mesmo tempo morta de vontade de sair correndo, permiti que a piada seguisse em frente e notei que havia listas para tudo, lista de classificação das minhas amigas, lista de classificação das mulheres de passagem pela cidade, das mulheres da cidade, das mulheres da cidade já contempladas pelo olhar que eu tanto apreciara e demais desdobramentos, lista das mulheres com as quais ainda não havia chegado aos desdobramentos... Mas que certamente chegariam e tantas outras mais.

Tudo isso me carregou do êxtase à agonia, invertendo o título do filme. Como é possível? Tanta decepção minutos após tanto êxito?

Assim são as relações atuais. Uma série de listas, de conquistas instantâneas, de certezas momentâneas. Lembro-me de uma discussão com outra figura semelhante, tempos atrás alegando que existem as coisas de momento e as coisas de instante.

É impressionante a volatilidade dos sentimentos. Adoro fazer listas de compras, de tarefas para desempenhar no trabalho, de presentes absurdos de aniversário... Mas pessoas? Listas de amantes? Classificação de affaires? Hierarquia de flertes? Ranqueamento de ficadas? Há uma especialização séria de graus de não envolvimento rolando por aí e é impressionante o quão mais distantes, frios e desapegados acreditamos que somos, quando na verdade já estamos prestes a nos mostrarmos mais comprometidos do que nunca! Basta um olhar de um segundo a mais ou a escolha de uma palavra ruim em um momento instantâneo qualquer, e tudo está perdido!

Deixei o homem das listas terminar sua classificação me divertindo muito com suas metas e com seu esforço em demonstrar que eu era mais uma de muitas conquistas. Assim que sua luta por não demonstrar envolvimento algum tinha terminado, não foi difícil ir embora.

Claro que esse pode ter sido o objetivo da encenação toda! Mas talvez poderia ter sido atingido com um pouco mais de doçura e cuidado. Porém, como disse no início deste post, másculo e masculino ainda são nuances que confundem os homens que, em sua maioria, não sabem quando ser um ou ser outro. A maioria das histórias que ouço e das minhas próprias, são incontáveis desastres resultantes da falta de sensibilidade de homens e mulheres, essas também muito confusas entre o feminino e o feminismo, o que deu vazão a erros de interpretação incríveis que a covardia levou ao extremo culminando em rupturas violentas sem necessidade.

O medo do amor como um cerceador da liberdade é assustador. Esse sentimento tem tantas faces! Às vezes me surpreendo ainda pensando em questões de amor... Por que dar a ele nomes e classificar em tipologias fechadas? Por que acreditar que pessoas e reações sejam passíveis de análises categoricas ou de padrão esperado? Quanto da vida e de pessoas interessantíssimas não se deixa de conhecer em nome de padrões tão aprisionadores quanto o sentimento do qual mais se teme...

Talvez o meu querido listador e classificador de mulheres não passe de mais um homem que procurou se defender de algum sentimento que talvez tenha emergido em meio a mais uma conquista. Mas um homem que me tema não me interessa, mais uma vez os enganos entre o masculino e o feminino me roubando mais uma bela história.

Ou... Talvez tenha sido uma conquista de anos que se desfez em uma única estada... Quem pode saber? Nem ele e nem eu talvez possamos responder com alguma certeza.

Só questiono o porquê de um final ruim para um começo tão excitante...

Decepcionei?

Também fiquei decepcionada... Afinal listas de compras são feitas para apoiar no carrinho do supermercado até percorrer todos corredores e jogar fora antes de chegar no caixa.

Amantes são poesia.

Anseio por reencontrar poesia, assim como anseio pela partida do inverno... Que por algum motivo ainda não se foi... Talvez porque ainda haja alguma lista chata de coisas que faltam acontecer para que o verão possa finalmente chegar!

Beijos listados e classificados como razoavelmente agradáveis.
Lix