sexta-feira, 9 de outubro de 2015

A Dor Saborosa

Ouvindo "Cry Me a River" de Julie London

https://www.youtube.com/watch?v=MkD_kYkRk3c


Ao cair de mais uma noite quente.

Quando o banho não refresca, nem o chá gelado, nem a reprise da sua série favorita. . .

Quando os versos tristes de Czeskaw Milosz não fazem sentido. . .

Você então se lembra do que te faz transpirar.

A dor saborosa. . .  Aquela que te faz sorrir e fechar os olhos assim que te espeta, como uma doce picada que traz um veneno róseo e perolado, daquele tipo que se espalha rapidamente e entorpece os sentidos assim que adentra às veias! Tão deliciosamente intoxicante!

Veloz e voraz a mente vai longe, por ondas de memórias, memórias variadas de sons e sabores, toques e silêncios, longos olhares e cortinas de voal flutuando, manchas de vinho no piso branco e prateado, cabelos revirados e sorrisos entorpecidos que se foram com o vento do inverno, mas que voltaram com o ar abafado da noite quente.

Uma voz e um corpo nu vagam pela casa enquanto a lua esvazia e se torna uma foice no céu mostrando que tudo o que é ruim deve ser cortado. . .

Mas não há coragem para cortar.

Não há vontade de cortar!

Deixa ela ficar mais um pouco!

Deixa a dor saborosa ficar mais um pouco, fazendo a pele raspar pelas paredes de quartzo em uma dor sem choro, sem lágrima, só olhos ardendo, só os ossos, os músculos e a pele gritando pelo que não volta mais!

Não tem mais volta porque está morto! A taça transbordante do amor está emborcada e agora corta a carne como quem faz círculos na massa de biscoitos.

Como quem corta alho com o copo virado com a boca para baixo.

Como quem faz círculos de vinho tinto derramado da taça na toalha de linho branca do restaurante.

Esmagando solitariamente cada restinho agonizante do que já foi um dia um grande amor.

Como quem vai dizendo adeus caminhando ao lado do trem que parte, só para prolongar mais um pouquinho. . .

A dor saborosa!

Aquela que não queremos largar porque é tão gostosa, dói tão gostosa, mesmo com os dias contados.

Mesmo com todas as estrelas e Deuses dizendo que não.

Mesmo indo embora, deixando a plataforma, sussurando pelo vidro: "... eu ainda te amo ... " e recebendo como resposta: "Adeus."

Uma boa, quente e saborosa noite para todos!



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