sábado, 2 de maio de 2015

A queda

. . . ouvindo "Don't Give Up" de Peter Gabriel


https://www.youtube.com/watch?v=8LMB6K4rTGU


Eu caí!

Eu caí da minha fé!

Como um cavaleiro cai de seu corcel antes da justa chegar ao auge!

Tudo foi tirado de mim tão rápido!

Antes que minhas mãos cobertas pelas luvas de cotas de malha e grevas de ferro pudessem ao menos alcançar!

Tudo se foi!

Tudo se foi em uma nuvem de tempestade que eu não vi chegar.

"Mas eu já estava me afastando!" lembro-me de sua voz ao telefone.

Um telefonema de adeus para tantos anos de amor, paixão e devoção.

Eu caí!

Eu caí por completo!

Caí de minha sanidade, de minha altivez, de minha feminilidade, das alturas em que me coloquei para te colocar ainda mais alto para te adorar.

E ouvi você me derrubando por telefone!

Como quem cutuca com um pedaço de pau bem longo, algo belo apenas pelo prazer de vê-lo se estilhaçar pelo chão e ter o poder de dizer; "Você não tem poder sobre mim!".

Mas você tem sobre mim!

Hoje flerto com a morte todos os dias!

Nas idas descuidadas para mais um dia fustigante de trabalho pela madrugada, na febre, na dor, no quase desmaio, no engano, no erro, na desatenção, no fracasso, no acerto sem querer, no desfalecimento de todas as horas por ainda não acreditar no que aconteceu!

Não acreditar que você se foi.

Se foi e me reduziu a um nada tão insignificante, indigno de merecer um último olhar ou uma última palavra de adeus!

E assim você se tornou poderoso sobre mim.

Sem dúvida um grande torturador!

Justamente o que eu pensei que você jamais se tornaria, torturado como disse que um dia foi.

Dia após dia você sabe da minha dor insuportável pelos meus e-mails e telefonemas.

E como bom torturador que é fica em silêncio assistindo a minha dor e com sua negligência me torturando ainda mais.

Um torturador eficiente, cruel e letal.

Esteja a vontade meu amor.

Drene de mim o pouco que me resta.

Eu lhe dou de bom grado.

Afinal esta é a natureza do meu amor.

A natureza do seu é destruir.

A natureza do meu é deixar-me destruir.

E assim seguiremos até o derradeiro equilíbrio desta equação.

Minhas carnes sacodem e meus ossos se estabacam no chão. Uma grande nuvem de poeira sobe para celebrar a minha ida a pique.

Eu caí da minha fé.

Eu caí da minha fé no amor que sentia e que - acreditava - receber.

Eu caí do cavalo.

Tão medíocre fim!

Poderia ser mais apoteótico, mais digno da energia que partilhamos por tanto tempo!

Talvez essa dignidade seria alcançada se você sacasse uma arma de fogo e me executasse com um tiro na cabeça, meu dedicado torturador.

Mas não dá pra fazer isso por telefone não é?

Teria que ser pessoalmente.

E se você assim o fizesse?!

Se tivesse culhões para vir a mim, olhar nos meus olhos e erguer a peça . . .

Se me visse prostrada diante de você? A mulher que você disse que amava por todos esses anos!

E você pronto para disparar, terminar com tudo, ver estilhaçar algo belo para poder dizer: "Você não tem poder sobre mim!"?

Será que você o faria?

Ou será que quem cairia da própria fé SERIA VOCÊ?!

Sua até a última gota drenada pela última negligência.

G.

Nenhum comentário: